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quinta-feira, março 28, 2024

Estudo revelou que tutores de gatos podem ser mais resistentes à COVID-19?

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No fim de maio e início de junho de 2020 foi disseminada uma notícia muito peculiar em sites brasileiros, principalmente aqueles dedicados ao mundo animal. Segundo essa notícia teria saído um estudo mostrando que pessoas, que têm um animal de estimação em casa, resistem à COVID-19 mais facilmente ou até de forma assintomática – sem apresentar sintomas.

O site da ANDA (Agência de Notícias de Direitos Animais), por exemplo, publicou que o convívio com animais domésticos, em especial com gatos, pode aumentar consideravelmente a imunidade contra a COVID-19. Foi citada também a existência de um ou mais estudos feitos por uma médica espanhola chamada Sabina Olex-Condor durante o pico da curva de casos na Espanha (arquivo).

Trecho do artigo publicado pela ANDA.

Essa mesma história foi publicada pelo site da Coordenadoria Estadual de Defesa da Fauna do Ministério Público de Minas Gerais (arquivo).

Trecho da notícia publicada no site da Coordenadoria Estadual de Defesa da Fauna do Ministério Público de Minas Gerais.

Já o blog de uma loja virtual brasileira chamada “Petlove” mencionou que o estudo, divulgado por uma influente revista chamada “Magazine Miau”, havia comprovado também que alguns profissionais da saúde que não tinham animais de estimação em casa foram infectados pela COVID-19, enquanto os que possuíam gatos continuaram saudáveis e trabalhando normalmente (arquivo).

Trecho do artigo publicado no site “Petlove”.

A Repercussão nas Redes Sociais

Nas redes sociais, essa história também viralizou. Um exemplo disso foi a publicação de Noraldino Júnior, deputado estadual por Minas Gerais, em 29 de maio de 2020, em sua página no Facebook. A publicação obteve mais de 5 mil compartilhamentos e 9 mil reações (arquivo).

Publicação de Noraldino Júnior, deputado estadual por Minas Gerais, em 29 de maio de 2020, em sua página no Facebook

Já um grupo, nessa mesma rede social, chamado “Amo gatos!!! =^..^=” chegou a pedir que as pessoas compartilhassem a notícia, que por sua vez tinha sido dada por um site de um jornal português (arquivo).

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A publicação, datada de 24 de maio de 2020, obteve mais de 700 compartilhamentos e cerca de 1.000 reações!

A publicação obteve mais de 700 compartilhamentos e cerca de 1.000 reações.

Entretanto, será que um estudo realmente revelou isso? Aliás, existe um estudo? Descubra agora, aqui, no E-Farsas!

Verdadeiro ou Falso?

Falso! Em primeiro lugar, não existe nenhum estudo que tenha revelado isso. Em segundo lugar, a “Magazine Miau” não é uma revista científica! Ela é tão somente uma revista portuguesa que fala sobre o mundo animal de maneira bem genérica. Não é voltada para a publicação de artigos científicos.

Em terceiro e último lugar, toda essa história é baseada em meras observações sem qualquer critério científico, nenhuma estatística ou dado confiável de uma médica de origem polonesa, que mora e trabalha na Espanha. Esse caso é uma sucessão de equívocos, que foram disseminados de maneira totalmente equivocada desde então.

A seguir, mostraremos a vocês a realidade por trás de toda essa história!

A Entrevista de Sabina Olex-Condor Publicada no Site do Jornal Polonês Głos Wielkopolski

Em 25 de abril de 2020, o site do jornal polonês “Głos Wielkopolski” publicou uma entrevista com uma médica polonesa chamada Sabina Olex-Condor (arquivo). Essa entrevista é crucial para que possamos compreender o que Sabina tinha em mãos naquela época. Diga-se de passagem, ela nunca mais tocou nesse assunto desde então.

Quem é Sabina Olex-Condor?

Em seu perfil no Facebook, podemos ver que Sabina adora felinos. Também encontramos algumas fotos dela juntamente com outros profissionais da área da Saúde em Madri, capital da Espanha (arquivo).

Foto de Sabina Olex-Condor juntamente com outros profissionais da área da Saúde.

Ela seria uma médica fisiologista uma profissional de saúde que se especializa nos benefícios da saúde do corpo, ajudando os pacientes a obterem mais qualidade de vida ou para tratar pacientes com uma condição médica através do exercício de origem polonesa, que mora e trabalha na Espanha. Nada indica que ela seja uma médica veterinária conforme alguns sites mencionaram, tampouco seja uma virologista ou infectologista.

Na entrevista não foi mencionado para qual hospital Sabina trabalhava, apenas que seria um pequeno hospital particular.

Por que Sabina-Olex-Conor Foi Entrevistada?

Sabina foi entrevistada devido a um burburinho que estava circulando desde março de 2020 envolvendo o seu nome. Exemplo disso foi um texto publicado no dia 25 de março, numa página polonesa no Facebook chamada “Ewa Zgrabczyńska- GOGH Rebellion.

A publicação obteve mais quase 9 mil compartilhamentos e foi recebida com grande entusiasmo pelas pessoas.

Sabina foi entrevistada devido a um burburinho que estava circulando desde março de 2020 envolvendo o seu nome.

Eis o que o texto dizia:

Amados, uma hipótese muito importante! A Dra. Sabina Olex-Condor, de um hospital de Madri (que orgulho!) fez observações muito importantes entre pacientes que tiveram contato com o coronavírus: as pessoas com gatos e cães não apresentaram sintomas, não desenvolveram a doença ou tiveram sintomas leves. As observações faziam referência a um grupo de cerca de 100 pacientes e requerem mais pesquisas. Existe uma suspeita de que possamos estar lidando aqui com maior uma imunidade devido ao contato com coronavírus específicos de animais de estimação e um sistema imunológico mais eficiente; pode ser referente à questão da reação cruzada

É interessante destacar aqui que o nome de Sabina já rondava a imprensa polonesa naquela época. Seu depoimento sobre a situação dos hospitais na Espanha foi publicado por um portal de noticias polonês chamado “Polsat News”, em 29 de março. No entanto, nesse depoimento ela não mencionou nada sobre gatos ou uma suposta imunidade cruzada.

Apenas Observações Empíricas

Durante a entrevista, Sabina disse que passou a observar, que colegas que tinham um gato em casa continuavam saudavéis para trabalhar, enquanto aqueles que não tinham gatos estavam adoecendo um após outro. Tal observação também teria sido feita em relação a pacientes infectados. Segundo Sabina, os pacientes eram questionados como era o ambiente de suas casas, e ela teria notado que a maioria deles não tinha animais de estimação em casa.

Ainda de acordo com Sabina, é sabido que os gatos possuem coronavírus que não afetam os seres humanos, mas ela acreditava que o convívio diário poderia passar os anticorpos dos gatos para os seres humanos, e que tais anticorpos poderiam destruir o SARS-CoV-2. Na entrevista, ela chegou a dizer que, para confirmar suas suposições seriam necessários estudos e pesquisas mais aprofundadas. Ela até chegou a citar a varíola como exemplo (mais tarde falaremos sobre isso).

Trecho da entrevista de Sabina Olex-Condor.

Ela também citou que isso seria chamado de imunidade cruzada e que essa proteção não seria 100%, porque nem todo gato teria entrado em contato com o coronavírus e nem todo mundo desenvolveria uma imunidade da mesma forma.

Nenhum Estudo Foi Publicado Por Sabina Olex-Condor

O jornal perguntou a Sabina se havia algum estudo que desse suporte a tais observações. Na época, ela disse que não havia encontrado nenhum, que aquilo era tão somente uma suposição dela, e ainda precisava ser provada. Diga-se de passagem, ela nem sabia dizer quantos pacientes e médicos ela havia realmente observado.

Quando questionada sobre o número mágico de 100, eis o que Sabina respondeu:

Mais ou menos, mas não contei, nem realizei nenhuma pesquisa ou pesquisa estruturada. É apenas uma observação

Sabina também foi questionada se ela havia apresentado suas observações para algum virologista. Ela disse que mencionou apenas para o diretor do hospital onde trabalhava. O diretor seria biólogo, “estaria por dentro da questão da imunidade cruzada”, mas curiosamente ela não disse qual era a opinião dele.

Na própria entrevista ela disse que não entrou em contato com nenhm virologista.

Sabina nem sabia dizer quantos pacientes e médicos ela havia realmente observado.

O Artigo Publicado Pelo Site “The First News”

No início de abril, um site de notícias pertencente a “Polish Press Agency” (Agência de Notícias Polonesa), a principal agência de notícias da Polônia, publicou um artigo sobre as observações de Sabina (arquivo).

O tempo todo foi mencionado que se tratavam apenas de observações, que precisavam de estudos para serem ou não confirmadas.

O tempo todo foi mencionado que se tratavam apenas de observações, que precisavam de estudos para serem ou não confirmadas.

Um Questionamento Feito no Site ResearchGate

Também no início de abril, um pesquisador polonês chamado Bartosz Ulaszewski, do departamento de Genética da Universidade Kazimierz Wielki, questionou aos demais colegas se era possível que donos de animais de estimação, especialmente gatos, pudessem ter uma imunidade mais elevada contra o SARS-CoV-2.

Brian Thomas Foley, especialista em epidemiologia molecular do Grupo de Biologia Teórica e Biofísica, do Laboratório Nacional de Los Alamos, nos Estados Unidos, foi enfático ao responder que não havia nenhuma evidência disso.

Eis a resposta dele:

Existem milhares de coronavírus infectando mamíferos. Os seres humanos geralmente são infectados por quatro que causam resfriados comuns (229E, OC43, HKU1 e NL63) e também fomos infectados por SARS-CoV (surto de 2003-2004) e MERS-CoV (2013 e outros pequenos surtos), bem como esta nova cepa (pandemia de SARS-CoV-2). Gatos e cães, e morcegos e porcos, gado e cavalos, todos têm coronavírus de vários tipos que os infectam também.

Não há evidências de que outros coronavírus de gato, assim como o coronavírus felino UU21 ou o vírus da peritonite infecciosa felina, possam infectar seres humanos ou causar proteção cruzada contra SARS-CoV-2. Esses vírus estão todos muito distantes entre si, assim como os 4 coronavírus comuns do resfriado humano, portanto não esperamos nenhuma proteção cruzada.

Se esse tipo de imunidade de proteção cruzada fosse possível, uma vacina contra influenza humana seria boa para todos, e seria fácil fabricar uma vacina para o HIV

Outras Considerações

Segundo Brian, o vírus SARS-CoV-2 não se originou em gatos. Ele até pode infectá-los, mas os gatos não são os hospedeiro naturais do vírus. E, ainda que ele possa infectá-los, ainda não está claro se poderia vir a se tornar uma pandemia em gatos, por exemplo. Assim sendo, o recomendado é que pessoas infectadas com SARS-CoV-2, que possuem gatos, não deixassem seus gatos passeassem livremente no bairro. Apenas por precaução, é claro.

Um Artigo Publicado num Periódico Nada Convencional

No dia 12 de maio, um artigo de autoria de médicos poloneses foi publicado online na “Medical Hypotheses”, um periódico não convencional e bem questionável (arquivo).

O periódico foi originalmente concebido para a divulgação de “ideias não convencionais sem o filtro tradicional de revisão científica por pares”. Para vocês terem uma ideia, em 2009 o periódico aceitou dois artigos de negacionistas dizendo que não havia provas que o HIV causasse a AIDS. Até hoje, mesmo passando por algumas reformulações, esse periódico inspira MUITA cautela, porque ele não adota um sistema clássico de revisão de pares, mas um “sistema feito sob medida para o próprio periódico”.

Intitulado “Do pets protect their owners in the COVID-19 era?“, o artigo sugeriu, mediante hipóteses e variáveis, uma possível explicação para as observações de Sabina. Não foi fornecida nenhuma prova de que isso, de fato, ocorra em seres humanos.  O artigo usa uma série de subterfúgios como o emprego das palavras “might” e “may” quase o tempo todo. Se alguém for descuidado durante uma tradução pode considerar que os médicos estão acreditando na possibilidade, porém o artigo tem viés mais negativo, um “talvez, mas pouco provável”, entendem?

Intitulado “Do pets protect their owners in the COVID-19 era?”, o artigo sugeriu, mediante hipóteses e variáveis, uma possível explicação para as observações de Sabina.

Enfim! O mais importante aqui é deixar claro que o artigo não é destinado a provar nada. No texto é mencionado, inclusive, que são necessários estudos para avaliar essa relação entre os coronavírus em animais de estimação e a COVID-19. Os médicos poloneses apenas disseram que isso valeria a pena ser investigado.

A Disseminação da Revista “Miau”

No dia 17 de maio, uma revista portuguesa chamada “Miau” de voz e espaço as observações de Sabina Olex-Condor. Curiosamente, não se tratava de uma notícia publicação na revista, mas um artigo de opinião de uma colunista chamada Fátima ChuEcco, uma ambientalista, palestrante, e amante dos animais (arquivo).

Embora se diga jornalista, Fátima não mostrou aos seus leitores nada daquilo que estamos apresentando a vocês, ou seja, não alertou aos leitores, de maneira enfática, sobre a realidade dos fatos. Por outro lado, ela nunca mencionou que se tratava de um estudo (sequer foi citado o artigo de médicos poloneses), mas uma hipótese de Sabina.

Não se tratava de uma notícia publicação na revista, mas um artigo de opinião de uma colunista chamada Fátima ChuEcco, uma ambientalista, palestrante, e amante dos animais.

De qualquer forma, a coluna de Fátima se tornou a “mãe” da absoluta maioria das publicações brasileiras. Estas, por sua vez, trataram a revista como “prestigiada”, “renomada” e “influente” numa espécie de tentativa de atribuir credibilidade e, assim, fazer com que o leitor acreditasse mais facilmente na narrativa.

Fato é que a revista “Miau” é apenas uma revista comum dedicada ao universo dos gatos, nada muito além disso. É bom deixar claro que não estamos desmerecendo a revista, apenas ressaltando que não é uma publicação científica.

A Questão Sobre a Imunidade Cruzada

Um das principais justificativas de Sabina Olex-Condor é a chamada imunidade cruzada. Tecnicamente, é o processo que acontece quando um anticorpo produzido contra uma parte X de um patógeno, acaba se ligando a essa mesma parte em outro patógeno, diferente do primeiro mas ainda assim geneticamente parecido com ele. Dessa forma, o combate a esse segundo patógeno se dá de forma mais rápida e eficiente, porque além de montar uma resposta imune própria para esse segundo patógeno, ainda há os anticorpos prévios, que auxiliam no combate a ele.

Numa adaptação em linhas gerais, dentro do contexto da atual pandemia, seria como dizer que, aqueles que já foram infectados por outros coronavírus poderiam ter uma maior resistência aos SARS-CoV-2. Isso vem sendo atualmente estudado em relação a COVID-19, e vem sendo cada vez mais aceito na comunidade científica, mas ainda não há nada que ofereça uma resposta definitiva sobre o assunto. Outro detalhe é que os estudos estão sendo voltados para os coronavírus humanos, não aqueles que afetam outros mamíferos, assim como cães e gatos.

Qual a Explicação Para Esse Pouco Interesse?

Em março deste ano, o site “GaúchaZH” conversou com um médico veterinário chamado Alexandre Pezzi.

Eis o que ele disse sobre os coronavírus animais:

Existem quatro grupos de coronavírus: alfa, que afeta mamíferos como gatos e cães, beta, dos humanos, gama e delta, encontrado em aves e peixes. São quatro famílias com diferenças grandes. Os outros vírus não se relacionam com os nossos. Não é uma grande preocupação, porque não se transmitem para nossa espécie

Para conseguir passar de uma espécie para outra, ele apontou que era necessário que ocorresse uma mutação muito específica. Além disso, não bastaria a mutação permitir que o vírus passasse de um animal para uma pessoa. Também seria preciso que ela permitisse a transmissão entre pessoas. Uma vez que a transmissão entre animais e humanos é considerada altamente limitada e rara, essa questão da imunidade cruzada a partir de coronavírus de cães e gatos não seria, a princípio, tão palatável assim.

Já houve até um experimento realizado na China, em 2016, envolvendo a bactéria Escherichia coli, mas foi algo bem limitado e necessitava de mais estudos.

A Opinião de Paulo Abilio Lisboa, Pesquisador do Instituto de Comunicação e Informação em Saúde (Icict), da Fiocruz

Numa entrevista publicada no site do Instituto de Comunicação e Informação Científica e Tecnológica em Saúde (Icict/Fiocruz), em meados de junho deste ano, o pesquisador Paulo Abilio Lisboa comentou sobre esse assunto. Segundo Paulo, não deveríamos considerar o que Sabina espalhou para o mundo.

Eis o que ele disse:

Tivemos relatos neste sentido, a partir da publicação de uma médica na Espanha, que observou que tutores de gatos tinham sinais menores em relação à doença ou não apresentavam sintomas. A informação da médica da Espanha é observacional e sem base científica nenhuma. Por isso, não devemos considerar essa hipótese.

Mas temos outro aspecto menos falado que é o papel dos animais domésticos na casa das pessoas, diminuindo a sensação de isolamento e criando um momento diário de convívio e felicidade – reduzindo assim o estresse e a ansiedade, contribuindo com a saúde mental em tempos de isolamento. Pessoas felizes têm menos estresse e têm melhor escore imunológico, sendo naturalmente menos suscetíveis a doenças.

A Opinião de Ana Terra, Bióloga e Professora de Universidade Anhanguera

Para falar sobre imunidade cruzada, e se isso faria sentido em relação ao convívio com animais domésticos, consultamos a professora e bióloga Ana Carolina Terra Mercadante. A responsável por entrar em contato com ela foi a jornalista Mônica Leão, que colaborou ativamente para a realização deste artigo.

Eis o que ela nos disse:

Nós só produzimos anticorpos para qualquer patógeno após termos contato com ele. Para formarmos os primeiros anticorpos demoramos em média 7 dias com o patógeno já nos infectando. É por isso que os testes de COVID, que procuram por IgM ou IgG, tipos de anticorpos, só funcionam após 1-2 semanas após o início da infecção.

Então, para termos anticorpos contra o coronavírus felinos, precisamos, primeiro, termos sido infectados por ele

Segundo Ana, a “reação cruzada” é algo que, de fato, existe na Biologia das infecções. Contudo, não há nenhuma evidência que comprove que essa reação cruzada e a consequente proteção ocorra a partir do convívio com a saliva e pêlos de animais domésticos.

Resumindo? Não há nenhuma comprovação científica de que o contato de humanos com o coronavírus felino ou canino induza qualquer proteção, no ser humano, contra o SARS-CoV-2.

Um Importante Adendo

Segundo Ana Terra, não há nenhum registro de transmissão dos coronavírus de gatos ou de cachorros infectando seres humanos. De acordo com ela, é importante entender que, para um vírus invadir e infectar um organismo, ele precisa ter uma proteína da célular que ele irá infectar, que podemos comparar com uma fechadura.

O SARS-CoV-2 tem a “chave” que encaixa na “fechadura” das nossas células. O coronavírus de gato e de cachorro não tem chave que se encaixe nas fechaduras das nossas células, logo não consegue nos infectar.

A Opinião do Dr. Bruno Filardi

Também entramos em contato com o Dr. Bruno Filardi, oncologista e diretor científico do Instituto do Câncer Brasil.

O Dr. Bruno vêm utilizando suas redes sociais, principalmente o Twitter, para analisar as mais diversas informações que andam circulando sobre o novo coronavírus e, sem dúvida alguma, presta um excelente serviço a sociedade, uma vez que não apenas tenta apresentar os fatos, mas os fundamenta para que fique o mais claro possível para a população. Em relação a esse caso, especificamente, ele foi um tanto quanto cauteloso.

Eis o que ele nos disse:

Sabina levantou uma questão interessante que merece um estudo. Nesse caso talvez seja interessante reforçar a metodologia científica onde a observação pessoal tem baixíssimo poder científico. Observações apenas levantam hipóteses que precisam de estudos. Isso faz com que essa afirmação (por mais que eventualmente possa vir a ser confirmada mais tarde) não deveria ser dita por um profissional da saúde

Questionamos o Dr. Bruno Sobre os Coronavírus Felinos

O Dr. Bruno não soube dizer se todos os coronavírus felinos não afetam os seres humanos. Ele disse que era muito cauteloso em fazer tais afirmações sem um estudo específico de revisão da literatura. Seria preciso fazer uma comparação de sequências entre esses coronavírus e os nossos.

De qualquer forma, isso não muda o fato que essa observação leva a hipóteses que precisam ser testadas, ou seja, não se pode sair afirmando isso de forma aleatória por aí, ainda mais sendo uma profissional da área da Saúde. Não à toa que a Ciência está em descrédito.

A Vacina Contra a Varíola

Segundo o Dr. Bruno, a vacina contra varíola veio de uma pessoa que observou, que mulheres que tiravam leite de vacas com varíola bovina (que também não afetava humanos) eram mais resistentes a varíola. Daí um médico inoculou a varíola bovina na sua família e criou a vacina.

A história sobre a vacina contra a varíola foi um dos argumentos de Sabina, mas o problema é que ela não apresentou nenhuma prova de que o convívio com gatos aumentaria a imunidade dos seres humanos contra o SARS-CoV-2. Enfim, a principal mensagem aqui é que não se pode afirmar isso sem um estudo específico. Caso isso aconteça faremos uma atualização tão logo seja possível.

A Nota do Conselho Federal de Medicina Veterinária

Entramos em contato com o Conselho Federal de Medicina Veterinária, que nos enviou uma nota sobre esse assunto:

Agradecemos e parabenizamos pela iniciativa de buscar fontes oficiais para prestar os devidos esclarecimentos nesse momento de pandemia, cercado de incertezas, de especulações e disseminações de informações equivocadas que pouco contribuem para o esclarecimento da sociedade.

Dentro da competência de fiscalizar e disciplinar o exercício profissional da Medicina Veterinária e da Zootecnia, o CFMV também tem travado a batalha da comunicação para levar informação consistente, de fontes oficias e de organismos internacionais de referência na área de saúde animal, especialmente para orientar a conduta dos profissionais que estão nas pontas, atuando nos estabelecimentos veterinários (clínicas, consultórios e hospitais), mas também nas unidades de saúde básica, nos centros de zoonoses, nos serviços veterinários de defesa sanitária, responsáveis pelas inspeções dos produtos de origem animal, bem como nas vigilâncias sanitárias.

Considerando que a hipótese proposta não foi ainda testada e/ou comprovada cientificamente e que está em estágio muito inicial, no qual só poderíamos especular sobre o assunto, entendemos não ser oportuno abordá-lo neste momento, sobretudo para falar à um público leigo.

Por ser a nossa missão primordial zelar pelo exercício profissional que garanta serviços veterinários de qualidade à sociedade, acreditamos que a sua pauta deva ser debatida pela academia, pela universidade, onde estão os pesquisadores, os desbravadores da ciência que hoje trabalham diuturnamente contra o relógio para entender como essa doença se comporta e como pode ser combatida, para que somente então o CFMV possa se manifestar.

Um Alerta Importante da Associação Veterinária Mundial de Pequenos Animais (WSAVA)

Num documento oficial emitido em março de 2020, a WSAVA informou algo muito importante sobre a utilização de vacinas destinadas a animais em seres humanos.

Os coronavírus pertencem à família Coronaviridae. Os alfa e beta coronavírus geralmente infectam mamíferos, enquanto os gama e delta coronavírus geralmente infectam pássaros e peixes. O coronavírus canino, que pode causar diarréia leve, e o coronavírus felino, que pode causar peritonite infecciosa felina (PIF), são ambos alfa-coronavírus. Esses coronavírus não estão associados ao atual surto de coronavírus. Até o aparecimento do SARS-Cov-2, que pertence aos beta-coronavírus, havia apenas seis coronavírus conhecidos, capazes de infectar humanos e causar doenças respiratórias, incluindo o SARS-CoV, causador da Síndrome Respiratória Aguda Grave (identificado em 2002/2003), e o MERS-CoV, causador da Síndrome Respiratória do Oriente Médio (identificado em 2012). O SARS-Cov-2 é geneticamentemaisrelacionado aoSARS-CoVdo que ao MERS-CoV, mas ambos são beta-coronavírus com origem em morcegos.

As vacinas contra o coronavírus canino disponíveis em alguns mercados globais destinam-se a proteger contra a infecção entérica por coronavírus e NÃO são licenciadas para proteção contra infecções respiratórias. Os veterinários NÃO devem usar essas vacinas diante do surto atual, pensando que pode haver alguma forma de proteção cruzada contra o SARS-Cov-2. Não há absolutamente nenhuma evidência de que a vacinação de cães com as vacinas comerciais disponíveis forneça proteção cruzada contra a infecção pelo SARS-Cov-2, uma vez que os vírus entéricos e respiratórios são variantes distintas do coronavírus. Atualmente, não existem vacinas disponíveis em nenhum mercado para infecção respiratória por coronavírus em cães

Enfim, acredito que ficou bem claro, não é mesmo?

A Importante Colaboração da Jornalista Mônica Leão

Conforme mencionamos anteriormente, este artigo contou com a importante colaboração da jornalista Mônica Leão. Ela havia desconfiado dessa história, que estava circulando nas redes socias e foi atrás para saber se era ou não verdade. Assim sendo, ela nos forneceu uma excelente base de pesquisa para podemos compor este artigo.

Conclusão

Falso! Em primeiro lugar, não existe nenhum estudo que tenha revelado isso. Em segundo lugar, a “Magazine Miau” não é uma revista científica! Ela é tão somente uma revista portuguesa que fala sobre o mundo animal de maneira bem genérica. Não é voltada para a publicação de artigos científicos. Em terceiro e último lugar, toda essa história é baseada em meras observações sem qualquer critério científico, nenhuma estatística ou dado confiável de uma médica de origem polonesa, que mora e trabalha na Espanha.

Para que vocês possam entender melhor essa situação RECOMENDAMOS FORTEMENTE que vocês LEIAM o artigo acima, combinado? Caso haja alguma novidade publicaremos uma atualização tão logo seja possível.

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Marco Faustinohttp://www.e-farsas.com/author/marco
Jornalista e colaborador do site de verificação de fatos E-farsas entre janeiro de 2019 e dezembro de 2020. Entre junho de 2015 e abril de 2018, trabalhei como redator do blog AssombradO.com.br, além de roteirista do canal AssombradO, no YouTube, onde desmistificava todos os tipos de engodos pseudocientíficos e casos supostamente sobrenaturais.

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9 COMENTÁRIOS

  1. Esse negócio de contaminação cruzada não funciona tão bem, temos o exemplo do Virus da dengue, que temos 4 tipos atualmente, porém, ter pego um não aumenta a sua imunidade aos outros.

  2. O certo é sempre desconfiar de coisas desse tipo. Antes mesmo de ler o artigo eu já sabia qual seria o “veredicto”. Mesmo que as pessoas sejam orientadas a checar as fontes, elas não possuem uma boa definição do que seria uma fonte “confiável”. Eu mesmo poderia criar um site com a fachada de um jornal, de revista científica ou qualquer coisa credível e disseminar um monte de fake e eu garanto que um monte de gente cai. Tem gente que acredita em qualquer photoshop.

  3. Esse negócio de contaminação cruzada não funciona tão bem, temos o exemplo do Virus da dengue, que temos 4 tipos atualmente, porém, ter pego um não aumenta a sua imunidade aos outros.

  4. O certo é sempre desconfiar de coisas desse tipo. Antes mesmo de ler o artigo eu já sabia qual seria o “veredicto”. Mesmo que as pessoas sejam orientadas a checar as fontes, elas não possuem uma boa definição do que seria uma fonte “confiável”. Eu mesmo poderia criar um site com a fachada de um jornal, de revista científica ou qualquer coisa credível e disseminar um monte de fake e eu garanto que um monte de gente cai. Tem gente que acredita em qualquer photoshop.

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