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quinta-feira, março 28, 2024

Um navio chinês teria desaparecido misteriosamente no “Mar do Diabo”?

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Será verdade que um cargueiro chinês, que estaria desaparecido desde 2012, teria entrado em uma outra dimensão numa região apelidada de “Mar do Diabo”, no Oceano Pacífico? Essa teria sido a alegação, de um suposto professor japonês chamado Junichi Yaoi, em um documentário chamado “The Devil’s Sea: Beyond the Bermuda Triangle“, atualmente disponível no serviço de streaming Prime Video da Amazon.

De acordo com um artigo divulgado pelo site “OVNI Hoje“, publicado em 18 de janeiro de 2019, que é basicamente uma cópia de um outro artigo publicado pelo tabloide britânico “Daily Express“, que por sua vez foi publicado dois dias antes, o “Mar do Diabo”, também conhecido como “Triângulo do Dragão” é uma área do Oceano Pacífico, próxima do Japão, que possui centenas de “contos paranormais.”

De acordo com um artigo divulgado pelo site “OVNI Hoje”, publicado em 18 de janeiro de 2019…

…que é basicamente uma cópia de um outro artigo publicado pelo tabloide britânico “Daily Express”, que por sua vez foi publicado dois dias antes, o “Mar do Diabo”, também conhecido como “Triângulo do Dragão” é uma área do Oceano Pacífico, próxima do Japão, que possui centenas de “contos paranormais.” Dizem, por exemplo, que navios e aeronaves desapareceriam misteriosamente nessa área

Dizem, por exemplo, que navios e aeronaves desapareceriam misteriosamente nessa área. Um desses desaparecimentos teria ocorrido em janeiro de 2012, quando o “MV Lin-je”, um cargueiro chinês com 19 tripulantes a bordo, não teria conseguido chegar ao porto japonês de Kagoshima. O navio teria desaparecido em algum lugar no Mar do Diabo, sem enviar nenhum sinal ou pedido de socorro. As autoridades teriam passado meses procurando pelos destroços do MV Lin-je, porém sem sucesso. Para Junichi Yaoi, o MV Lin-je teria ido parar em outra dimensão.

Entretanto, será que o Mar do Diabo realmente existe, e estranhos fenômenos acontecem em suas águas? Será que o MV Lin-je realmente existiu? E, se existiu, será que ele realmente foi parar em uma outra dimensão ou desapareceu sem nenhuma explicação? Descubra agora, aqui, no E-Farsas!

Contextualizando o Caso: O “Mar do Diabo” ou “Triângulo do Dragão” Realmente Existe?

Não, e vamos explicar o porquê. Essa área que mencionamos anteriormente possui diversos nomes: “Mar do Diabo”, “Triângulo do Dragão”, “Triângulo de Taiwan”, e assim como o Triângulo das Bermudas, às vezes, é chamado de “Triângulo do Diabo”. Sua localização varia um pouco dependendo da fonte que você consultar, mas o tal triângulo geralmente vai desde Taiwan até a ilha vulcânica de Miyake-jima, ao sul de Tóquio, e aos arredores de Iwo-jima. Miyake-jima e Iwo-jima encontram-se ao longo do arco vulcânico de Izu-Bonin, uma linha de vulcões submarinos e ilhas, que faz parte de um sistemam, que se estende por 2500 quilômetros desde o Japão até Guam. Alguns autores de livros sobre o assunto, assim como Charles Berlitz, dizem que o “Mar do Diabo” é tão perigoso e misterioso quanto o famoso “Triângulo das Bermudas”, que você provavelmente já deve ter ouvido falar, mas não será nosso foco nesse momento.

Em seu livro “The Dragon’s Triangle“, de 1989, Berlitz disse que o Japão perdeu cinco embarcações militares na área, entre 1952 e 1954, com uma perda de cerca de 700 marinheiros. Já no livro de Dan Cohen, “Curses, Hexes & Spells“, de 1974, é relatado que as lendas sobre o perigo do “Mar do Diabo” remontam a séculos no Japão. Sua vítima mais famosa teria sido o Kaiyo-Maru No.5, uma embarcação de pesquisa científica, que desapareceu do mapa em 24 de setembro de 1953 (essa data é muitas vezes erroneamente mencionada como sendo em 1952 ou 1958).

Capas das primeiras edições dos livros de Charles Berlitz e Daniel Cohen

Com uma história tão dramática, você espera que haja dezenas ou centenas de livros sobre o assunto, especialmente no Japão, não é mesmo? Porém, quando o escritor e produtor Brian Dunning, responsável pelo site “Skeptoid”, realizou uma busca por livros, jornais ou artigos de revistas sobre o “Mar do Diabo” não encontrou nada até 20 anos após o desaparecimento do Kaiyo-Maru No.5. Aparentemente, a história, e até mesmo a própria existência dessa região lendária, não tinha sido inventada até algum tempo atrás.

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Aliás, ao longo do tempo, foram criadas diversas áreas sobrepostas aos mapas para ilustrar o “Mar do Diabo” e com tamanhos diferentes, ou seja, cada um passou a inventar o tamanho que fosse mais conveniente para explicar os supostos desaparecimentos de embarcações ou aeronaves.

Aliás, ao longo do tempo, foram criadas diversas áreas sobrepostas aos mapas para ilustrar o “Mar do Diabo” e com tamanhos diferentes, ou seja, cada um passou a inventar o tamanho que fosse mais conveniente para explicar os supostos desaparecimentos de embarcações ou aeronaves.

Para explicar isso melhor, vamos voltar rapidamente no tempo para falar de um homem chamado Ivan T. Sanderson, criptozoologista e entusiasta do mundo paranormal, que foi conhecido internacionalmente por suas buscas relacionadas ao lendário “Pé-Grande.” Poucos sabem, mas ele foi responsável, na década de 60, por fundar a “Society for the Investigation of the Unexplained” (“Sociedade para a Investigação do Inexplicável”, em português, ou simplesmente SITU, sigla em inglês). Uma sociedade destinada, na teoria, para a aquisição, investigação e disseminação de informações sobre relatórios de todos os itens tangíveis nos campos da química, astronomia, geologia, biologia e antropologia, que não eram prontamente explicáveis. Assim sendo, durante as décadas de 60 e 70, membros do movimento da Nova Era e outros paranormais foram até a propriedade de Sanderson, apelidada de “The Farm“, para ler, escrever e pesquisar sobre os mais variados assuntos.

Assim sendo, durante as décadas de 60 e 70, membros do movimento da Nova Era e outros paranormais foram até a propriedade de Sanderson, apelidada de “The Farm” (foto acima), para ler, escrever e pesquisar sobre os mais variados assuntos.

No boletim informativo do grupo, em abril de 1971, Sanderson escreveu sobre algo que ele chamou de “vórtices vis”, doze pontos ao redor do mundo que ele acreditava que poderiam ser portais para outra dimensão. Em 1972, o artigo foi reimpresso em uma revista chamada Saga sob o título “Os Doze Cemitérios do Diabo ao Redor do Mundo.” Além do Polo Norte e do Polo Sul, Sanderson propôs dez triângulos ao redor do globo, todos do mesmo tamanho, forma e orientação que o famoso “Triângulo das Bermudas.” Cinco, incluindo o “Triângulo das Bermudas”, estão supostamente localizados de forma equidistante ao redor do Trópico de Câncer (cerca de 23,5 ° N), e os outros cinco localizados ao longo do Trópico de Capricórnio (cerca de 23,5 ° S). O “Mar do Diabo” é um dos cinco triângulos do norte, próximo a outro nos arredores dos vulcões do Havaí.

Os vórtices vis de Sanderson são apenas um dos inúmeros sistemas teóricos de divisões sobrepostos na Terra por entusiastas da Nova Era ao longo dos anos. Se você usar um pouco a imaginação, um icosaedro, um poliedro regular composto com 20 triângulos equiláteros, quase cabe na representação inventada por Sanderson. Outros sistemas de divisões sugerem um dodecaedro, um poliedro de doze lados com lados pentagonais. Há também o “mapa da grade planetária” de Becker-Hagens, proposto em 1983, e a “grade russa”, que representa a Terra em um formato cristalino. Enfim, pegue praticamente qualquer sítio antigo (a Grande Pirâmide, Machu Picchu, Tiwanaku etc…), e você pode ter certeza de que um membro do movimento da Nova Era escreveu um livro desenhando linhas de supostos alinhamentos aleatórios, e chamou a posição deles, na Terra, de “espiritualmente significativa.”

Além do Polo Norte e do Polo Sul, Sanderson propôs dez triângulos ao redor do globo, todos do mesmo tamanho, forma e orientação que o famoso “Triângulo das Bermudas.

Os vórtices vis de Sanderson são apenas um dos inúmeros sistemas teóricos de divisões sobrepostos na Terra por entusiastas da Nova Era ao longo dos anos. Há também o “mapa da grade planetária” de Becker-Hagens (imagem acima), proposto em 1983, e a “grade russa”, que representa a Terra em um formato cristalino.

Foi justamente na propriedade de Sanderson, que Charles Berlitz pesquisou e escreveu partes do livro “The Bermuda Triangle” (1974) e, foi a partir dos vórtices vis, de Sanderson, que ele teve inspiração para o “Mar do Diabo.” Foi somente após seu livro publicado em 1974, que citava o “Mar do Diabo” como uma outra área além do “Triângulo das Bermudas,” que a literatura repentinamente ficou inundada de relatos dessa nova região misteriosa, além de fábulas, de que era temida durante séculos. Em sua pesquisa Brian Dunning não encontrou nenhuma referência ao “Mar do Diabo” (ou qualquer um dos seus outros nomes) em nenhum livro ou jornal, nem em inglês e nem em japonês, antes das publicações de Berlitz e Sanderson. Tal busca revelou que, quase todas as referências publicadas são do início da década de 70, logo após os artigos de 1971 e 1972 de Sanderson (lembrando que o “Triângulo das Bermudas”, também possuía esse apelido nessa época).

Porém, e quanto aos desaparecimentos de navios em décadas anteriores? Muitos sites citam que, após o desaparecimento do Kaiyo-Maru No.5, em 1953, as autoridades japonesas teriam declarado uma extensa área marítima de centenas de quilômetros (entre as ilhas Izu e Ogasawara) como um zona de perigo. Essa alegação teria partido, na época, de um jornal japonês chamado “Yomiuri Shimbun”. No entanto, no início da década de 70, o então bibliotecário norte-americano Larry Kusche, e posteriormente autor do livro “The Bermuda Triangle Mystery Solved“, desmentiu a lenda sobre o “Mar do Diabo”. Ele enviou cartas para diversos escritórios governamentais, mas ninguém sabia sobre o “Mar do Diabo” ou uma zona de perigo dessa proporção. A zona de perigo verdadeira, na qual a Agência de Segurança Marítima do Japão alertou para ninguém se aproximar, no passado, tinha apenas 16 km de extensão.

A região em azul seria a área noticiada como uma zona de perigo por um jornal japonês na década de 1950. Contudo, Larry Kusche descobriu que, oficialmente, a área era muito menor, cerca de apenas 16 km, que estão representados no pequeno ponto vermelho do mapa à esquerda.

Larry Kusche também assumiu a tarefa de esclarecer os supostos desaparecimentos de navios militares japoneses citados por Charles Berlitz em seu livro “The Dragon’s Triangle” (1989). Ele descobriu que, aquilo que Berlitz chamara de navios militares eram, na verdade, barcos de pesca, e eles tinham desaparecido na mesma proporção em que os barcos de pesca sempre desapareceram dentro e fora do Japão, estivessem eles dentro ou não do vórtice vil de Sanderson. A pesca em alto mar sempre foi perigosa e, às vezes, infelizmente barcos de pesca afundam. Diga-se de passagem Berlitz era conhecido por inventar dados sobre os assuntos que escrevia.

O desaparecimento do Kaiyo-Maru No.5 não foi misterioso. Sua tripulação de 9 cientistas e 22 tripulantes tinha sido destinada a documentar um vulcão submarino muito ativo chamado Myōjin-Shō, que entrou em erupção entre 1952 e 1953, criando ilhas que apareciam repetidamente e explodiam algum tempo depois, dando origem a novas ilhas. A embarcação estava simplesmente no lugar errado, na hora errada, e foi destruída por uma ejeção vulcânica, gerando uma espécie de tragédia nacional. Os destroços do navio foram encontrados posteriormente, provando que ele não tinha ido a nenhuma dimensão alternativa.

O desaparecimento do Kaiyo-Maru No.5 não foi misterioso. Sua tripulação de 9 cientistas e 22 tripulantes tinha sido destinada a documentar um vulcão submarino muito ativo chamado Myōjin-Shō, que entrou em erupção entre 1952 e 1953, criando ilhas que apareciam repetidamente e explodiam algum tempo depois, dando origem a novas ilhas. A embarcação estava simplesmente no lugar errado, na hora errada, e foi destruída por uma ejeção vulcânica, gerando uma espécie de tragédia nacional

Infelizmente, embarcações e aeronaves desaparecem em diversas regiões do Oceano Pacífico e por inúmeros motivos, e nenhum deles é sobrenatural. Em primeiro lugar, o Oceano Pacífico, o maior oceano da Terra é um ambiente totalmente caótico. É flanqueado por cadeias montanhosas submersas, com intensa atividade vulcânica (a exemplo do “Círculo de Fogo do Pacífico” e dos vulcões submarinos japoneses, sendo que alguns são alvo de constantes alertas), e vales que podem chegar a mais de 11.000 metros de profundidade (a Fossa das Marianas). É uma fábrica tanto de fenômenos oceânicos-atmosféricos (a exemplo da “La Niña” e do “El Niño), quanto de tufões e supertufões. Para vocês terem uma ideia, a região noroeste do Oceano Pacífico (Pacífico Noroeste) é a região mais ativa do planeta, respondendo por um terço de toda a atividade de ciclones tropicais. Foram cerca de 1500 tempestades tropicais ou tufões registrados, somente nessa região, entre 1959 a 2014. No ano passado, ou seja, em 2018, foram 29 tempestades tropicais, 13 tufões, e 7 supertufões.

Mapa mostrando a quantidade e as trajetórias desde depressões tropicais até supertufões (cada linha pontilhada representa um evento), variando entre as cores mais claras, até as mais escuras (as linhas em vermelho são os supertufões). Cada ponto corresponde um intervalo de apenas 6 horas de cada tempestade ou tufão.

O Oceano Pacífico, principalmente a área que tentam apelidar de “Mar do Diabo” é um vasto campo de hidratos de metano, que estão presentes no fundo do oceano. Esses hidratos de metano são basicamente uma mistura, onde os cristais de gelo aprisionam moléculas de metano, que ficam estáveis até uma temperatura de 18ºC, sob grandes pressões. Acima disso eles simplesmente explodem, e geram uma poderosa erupção de gás em direção a superfície do oceano, podendo interromper a flutuação e afundar um navio, principalmente de pequeno porte, não deixando nenhum vestígio para trás (uma situação que pode se agravar devido as mudanças climáticas. Mesmo diante de tanto caos, e de um intenso fluxo de aeronaves e navios no Oceano Pacífico devido a atividades de pesca, pesquisa e rotas comerciais, algumas pessoas preferem acreditar que naves extraterrestres afundam navios ou então que buracos negros os levam para outra dimensão.

Resumindo? Não existe “Mar do Diabo” e nunca houve um, exceto na imaginação de Ivan Sanderson, dos autores que escreveram sobre seus vórtices vis, e daqueles que exploram esse assunto de forma sensacionalista ou alarmista.

Alguns Casos ou Desaparecimentos Citados no Documentário “The Devil’s Sea: Beyond the Bermuda Triangle”

O documentário “The Devil’s Sea: Beyond the Bermuda Triangle” foi produzido pela produtora NHNZ (antigamente chamada “Natural History New Zealand“) em associação com o canal norte-americano “TLC”, e foi lançado em 2003. Apesar de repetir diversas informações constantemente ao longo de 49 minutos, o documentário cita alguns desaparecimentos no “Mar do Diabo” que, conforme vimos anteriormente não existe, exceto na imaginação daqueles que adotaram essa ideia e a exploram de maneira comercial ou até mesmo conspiratória.

O documentário “The Devil’s Sea: Beyond the Bermuda Triangle” foi produzido pela produtora NHNZ (antigamente chamada “Natural History New Zealand”) em associação com o canal norte-americano “TLC”, e foi lançado em 2003.

Não irei fazer uma resenha sobre o documentário, visto que esse texto ficaria absurdamente longo, mas é possível encontrá-lo disponível, gratuitamente, no YouTube (não podemos publicar o endereço, porque poderia ser considerado uma espécie de incentivo para a prática da pirataria, mas você acharão facilmente). De qualquer forma, vamos comentar sobre alguns desparecimentos ou casos citados, a realidade por trás deles, e algumas outras informações, que aparentemente foram inventadas para o documentário.

MV Lin-Je

O documentário diz, que em janeiro de 2002 (não em 2012), o MV Lin-je, um cargueiro chinês com 19 tripulantes a bordo, não chegou ao porto japonês de Kagoshima. Conforme os meses passaram, as autoridades não souberam explicar o que aconteceu com o Lin-Je. A embarcação desapareceu sem emitir um pedido de socorro, e sem deixar nenhum sinal de seu destino.

O documentário diz, que em janeiro de 2002 (não em 2012), o MV Lin-je, um cargueiro chinês com 19 tripulantes a bordo, não chegou ao porto japonês de Kagoshima. Conforme os meses passaram, as autoridades não souberam explicar o que aconteceu com o Lin-Je. A embarcação desapareceu sem emitir um pedido de socorro, e sem deixar nenhum sinal de seu destino.

Entretanto, aparentemente, o MV Lin-Je nunca existiu. Não é possível encontrar nenhuma informação sobre o desaparecimento de um navio chamado Lin-Je, em 2002, no arquivo de incidentes do site da Administração Oceânica e Atmosférica Nacional, dos Estados Unidos. Também não é possível encontrá-lo na lista de naufrágios da Wikipédia, referente ao ano de 2002, nem na lista de desaparecimentos. Não há nenhuma informação sobre o registro de qualquer navio chamado Lin-Je (ou Lin Je) no site ClassNK, uma sociedade de classificação de embarcações, mesmo diante de uma lista com mais de 9 mil nomes. Evidentemente, também procuramos na sociedade chinesa de classificação de navios, porém não houve nenhum resultado mesmo diante de uma lista com 4 mil nomes. Para completar, não encontramos nenhuma notícia, artigo de jornal ou revista, sobre o desaparecimento ou existência de um navio chamado MV Lin-Je. Vale ressaltar nesse ponto, que o documentário não forneceu nenhuma foto do navio, documento ou relatório oficial do suposto incidente.

Agora, um detalhe muito peculiar: curiosamente, existe um navio chamado Lin Jie! Um cargueiro em operação desde 2003, que navega sob a bandeira de Hong Kong, uma região administrativa especial da China. Como curiosidade, é possível rastrear o Lin Jie pela internet. Ele saiu do porto de Nantong, na China, no dia 29 de dezembro de 2018, e deve chegar ao porto de Tubarão, aqui no Brasil, em 4 de fevereiro de 2019. É difícil saber se o Lin Jie serviu de inspiração para o Lin Je, de qualquer forma o Lin Jie não desapareceu.

Agora, um detalhe muito peculiar: curiosamente, existe um navio chamado Lin Jie! Um cargueiro em operação desde 2003, que navega sob a bandeira de Hong Kong, uma região administrativa especial da China.

USAF C-97 Stratofreighter

O documentário diz, que em 22 de março de 1957, um USAF C-97 Stratofreighter (um avião militar de carga da Força Aérea dos Estados Unidos) partiu da Ilha Wake com destino ao Aeroporto Internacional de Tóquio com 67 militares internacionais a bordo. O voo estava programado para levar nove horas e meia e havia combustível suficiente para 13 horas e meia na aeronave. Próximo do horário de chegada, o piloto teria reportado que todo o equipamento estava funcionando normalmente. O tempo na região estaria bom, a as condições de voo seriam quase perfeitas. Porém, uma hora e meia depois, quando a aeronave estava a 320 km de Tóquio, ela desapareceu. Buscas foram feitas, mas não havia nenhum sinal do USAF C-97 Stratofreighter.

Foto mostrando uma aeronave modelo C-97 Stratofreighter

Entretanto, apesar desse caso ser verídico, as condições do tempo não eram tão boas assim. De acordo com o site do Escritório de Arquivos de Acidentes Aeronáuticos, devido à falta de evidências, as investigações não conseguiram determinar a causa exata do acidente. No entanto, foi relatado que as condições climáticas não eram tão boas, com nuvens entre 1.500 e 3.000 metros, com turbulências e condições de formação de gelo.

Task Force 38

O documentário diz, que em dezembro de 1944, a Task Force 38 (Força-Tarefa 38, em português), uma frota norte-americana de ataque rápido, composta por diversos navios de guerra, teria enfrentado a fúria de um poderoso tufão, que pegou a frota de surpresa. Como resultado, três contratorpedeiros (destroyers, em inglês) afundaram, mais de 200 aviões foram arrancados dos porta-aviões, e 765 militares morreram.

Entretanto, apesar desse caso ser verídico, há informações importantes que foram omitidas. De acordo com o site oficial da Marinha dos Estados Unidos, em 18 de dezembro de 1944, os contratorpedeiros USS Hull (DD 350), USS Monaghan (DD 354) e USS Spence (DD 512) afundaram durante a passagem de um tufão ao largo da costa das Filipinas. Mais de 765 homens se afogaram como resultado da tempestade. O Almirante Halsey, responsável por decidir a trajetória dos navios, enfrentou uma corte de inquérito sobre o assunto e foi considerado o principal responsável por falhar em tirar os navios do caminho do tufão.

O documentário diz, que em dezembro de 1944, a Task Force 38 (Força-Tarefa 38, em português), uma frota norte-americana de ataque rápido, composta por diversos navios de guerra, teria enfrentado a fúria de um poderoso tufão, que pegou a frota de surpresa. Entretanto, apesar desse caso ser verídico, há informações importantes que foram omitidas.

Na época, William Halsey Jr. era o Comandante do Pacífico Sul. Em 17 de dezembro de 1944, uma operação de reabastecimento da frota foi interrompido devido a uma forte tempestade. Halsey, que tinha fama de agressivo, optou por ignorar alguns dos sinais e permaneceu em posição de apoiar desembarques programados na ilha de Mindoro. Para ser justo, ele recebeu informações conflitantes de Pearl Harbor e de sua própria equipe. Os meteorologistas havaianos previram um determinado caminho para a tempestade, que lhe dava uma boa margem de segurança. Porém, sua equipe apontava que a tempestade estava bem mais próxima deles, e com um caminho diferente. Helsey decidiu arriscar e resolveu não cancelar as operações programadas. No dia seguinte, em questão de apenas algumas horas, a tempestade se transformou em um poderoso tufão.

Resumindo? Halsey acabou levando sua frota direto para o tufão, mas isso não quer dizer que ele não sabia dos riscos que estava correndo. Curiosamente, em junho de 1945, Halsey voltou a comandar a frota em uma campanha final, e novamente levou seus subordinados em direção a outro tufão. Dessa vez seis vidas foram perdidas, e 75 aeronaves destruídas. Nenhum navio foi perdido naquela ocasião.

O Navio Soviético Vladimir Volbirov

O documentário diz, que em 18 de agosto de 1980, um navio soviético chamado “Vladimir Volbirov” estava retornando de uma missão de pesquisa na costa do Japão. O líder da expedição, o professor Platinov, alegou estar de vigia quando, de repente, um objeto submerso não identificado emergiu do mar e circulou o navio. Segundo o professor, o mesmo tinha formato cilíndrico, e emitia uma luz azul ofuscante. O professor relatou, que a estranha nave não era como nada deste mundo, um objeto não identificado que circulou o navio por vários minutos e depois mergulhou de volta no oceano tão repentinamente quanto havia aparecido.

Entretanto, aparentemente, o navio soviético Vladimir Volbirov nunca existiu. Não encontramos nenhum registro histórico envolvendo um navio soviético chamado Vladimir Volbirov (nem em inglês, e nem em russo), ou qualquer menção sobre um professor chamado Platinov envolvido com tais declarações. O documentário não forneceu nenhuma foto, documento ou relatório oficial do suposto incidente.

MV Derbyshire

O documentário é basicamente sobre o “MV Derbyshire”, um cargueiro britânico construído pela companhia Swan Hunter em 1976 (um dos seis cargueiros de sua série), e que simplesmente desapareceu nas águas do Pacífico, mais precisamente a 370 km da ilha de Okinawa, no Japão, no início de setembro de 1980, ou seja, apenas 4 anos após ser construído. O navio era considerado bem moderno para sua época, possuía uma tripulação experiente, e capaz de enfrentar fortes tempestades. No meio do caminho,  no entanto, o “MV Derbyshire” enfrentou a fúria do tufão Orchid. Os proprietários acreditavam, que o cargueiro conseguiria passar, sem maiores problemas, pelo mar agitado devido aos ventos de mais de 150 km/h. No entanto, isso não aconteceu, e o MV Derbyshire simplesmente desapareceu no oceano, ceifando todas as 44 vidas que estavam a bordo, juntamente com 150.000 toneladas de minério de ferro, sem emitir um único pedido de socorro sequer.

O documentário é basicamente sobre o “MV Derbyshire”, um cargueiro britânico construído pela companhia Swan Hunter em 1976 (um dos seis cargueiros de sua série), e que simplesmente desapareceu nas águas do Pacífico, mais precisamente a 370 km da ilha de Okinawa, no Japão, no início de setembro de 1980, ou seja, apenas 4 anos após ser construído. Antes de se chamar MV Derbyshire, o navio se chamava Liverpool Bridge.

Curiosamente, dois navios da mesma série que o “MV Derbyshire”, o “MV Kowloon Bridge” e o “MV Tyne Bridge” apresentaram sérios problemas estruturais, devido a uma falha do projeto dessa série, alguns anos depois. Tal situação fez com que a investigação, sobre o que havia realmente ocorrido com o navio, fosse reaberta por parentes das vítimas do “MV Derbyshire”. Assim sendo, uma busca em águas profundas foi iniciada. Em junho de 1994, os destroços do “MV Derbyshire” foram encontrados a uma profundidade de 4 km, distribuídos por 1,3 km. Uma expedição adicional passou mais de 40 dias fotografando e examinando o campo de destroços em busca de evidências do que afundou o navio.

Em junho de 1994, os destroços do “MV Derbyshire” foram encontrados a uma profundidade de 4 km, distribuídos por 1,3 km. Uma expedição adicional passou mais de 40 dias fotografando e examinando o campo de destroços em busca de evidências do que afundou o navio.

Por fim, determinou-se, que as ondas que se chocavam sobre a frente do navio haviam arrancado as tampas de pequenos tubos de ventilação próximos da proa. Ao longo das horas seguintes, a água do mar entrou através dos tubos expostos na seção dianteira do navio, fazendo com que a proa se movesse lentamente, cada vez mais para baixo.  Finalmente, a proa ficou completamente exposta a toda a força das ondas, e isso fez com que a tampa da escotilha de carga do primeiro compartimento curvasse para dentro, permitindo que centenas de toneladas de água entrassem em questão de segundos. Quando o navio começou a afundar, a segunda e terceira escotilha também falharam, arrastando o navio para debaixo d’água. Quando o navio afundou, a pressão da água fez com que o navio simplesmente implodisse, tornando impossível a sobrevivência dos tripulantes.

O Breve Comentário do “Professor” Junichi Yaoi

Conforme vocês puderam notar, o documentário “The Devil’s Sea: Beyond the Bermuda Triangle” é uma estranha mistura de casos verdadeiros (embora pecando na omissão de informações importantes, que ajudariam a esclarecer melhor os casos) com outros aparentemente falsos. Isso porque não foi possível encontrar nenhuma informação disponível sobre o tal cargueiro chinês “MV Lin-Je”, e muito menos sobre um navio de pesquisa soviético chamado Vladimir Volbirov.

No documentário também aparece um cidadão chamado Junichi Yaoi, que foi apresentado como “autor e especialista em fenômenos paranormais.” Já no lettering, ele apareceu como “professor de Ufologia” pela Universidade IOND. Essa universidade é uma fornecedora não credenciada de educação a distância baseada no Japão, e registrada como uma corporação doméstica sem fins lucrativos, no Havaí, nos Estados Unidos. É uma instituição envolvida em uma séries de polêmicas, e o próprio Estado do Havaí já entrou na Justiça contra a IOND por violações as leis estaduais de defesa do consumidor. Enfim, basta dar uma olhada na página principal da universidade para ter uma noção, que não é uma instituição realmente séria. Quanto a questão da Ufologia, bem, como diria Salvador Nogueira, do blog Mensageiro Sideral, gostando ou não, Ufologia não ciência. Portanto, o título de professor nesse caso é um tanto quanto questionável.

No documentário também aparece um cidadão chamado Junichi Yaoi, que foi apresentado como “autor e especialista em fenômenos paranormais.” Já no lettering, ele apareceu como “professor de Ufologia” pela Universidade IOND.

No vídeo, Junichi Yaoi aparece dizendo, que haveria muitas respostas possíveis para explicar os misteriosos desaparecimentos no “Mar do Diabo”. Basicamente, ele acredita que muitos navios petroleiros afundavam devido as condições do mar. Isso porque, tais incidentes ocorrem em mares agitados ou devido a tempestades. Entretanto, se os navios petroleiros simplesmente desparecem, talvez, eles podem ter ido parar em outra dimensão. Ele disse acreditar, que havia uma entrada aberta para essa dimensão naquela área. Em um outro trecho, Junichi Yaoi tenta comparar a transmissão de ondas de rádios, que não podemos ver ou tocar, como se outras dimensões agissem da mesma forma. Essa é toda a participação de Junichi Yaoi no documentário. Provavelmente, suas duas falas, se somadas, não dão nem um minuto.

Verdadeiro ou Falso? Uma Pequena Lista de Problemas!

Uma vez que explicamos diversos detalhes de toda essa história, podemos citar uma série de problemas:

  • A data citada para o desaparecimento do “MV Lin-Je”, tanto no texto do “OVNI Hoje”, quando do “Daily Express” é janeiro de 2012. Isso seria impossível, visto que o documentário foi lançado em 2003;
  • Ao assistir o documentário, é possível notar claramente, que a data correta seria janeiro de 2002. Isso denota que nenhuma fonte realmente se preocupou em fazer tal verificação;
  • Entretanto, pelo que tudo indica, o cargueiro “MV Lin-Je” nunca existiu. Portanto, jamais teria afundado, desaparecido ou ido para outra dimensão;
  • Ainda que o “MV Lin-Je” existisse, a alegação de Junichi Yaoi, que pertenceria a uma instituição sem nenhuma credibilidade acadêmica, sobre a existência de um portal aberto para outra dimensão no “Mar do Diabo”, não tem nenhum embasamento científico;
  • O tal “Mar do Diabo” também não existe, exceto na imaginação de Ivan Sanderson, dos autores que escreveram sobre seus vórtices vis, e daqueles que exploram esse assunto de forma sensacionalista ou alarmista.

Diante dessa série de problemas, acredito que vocês já devem imaginar a conclusão.

Conclusão

A alegação de que um cargueiro chinês teria ido parar em outra dimensão é totalmente infundada a começar pelo fato de que, aparentemente, o “MV Lin-Je” nunca sequer existiu.

Muitas vezes, textos de tabloides e de sites acostumados a replicar artigos de cunho conspiratório tentam envolver o leitor, o fazendo acreditar, por exemplo, que apenas pelo fato de um documentário estar disponível em um serviço de streaming, que dizer automaticamente que seja totalmente credível. O mesmo vale para diversos personagens, que nele aparecem e seus supostos títulos, que teoricamente poderiam causar uma impressão positiva e de credibilidade no espectador. A realidade, no entanto, é muito mais dura, quando se realmente pesquisa o que é divulgado e quem são as pessoas por trás das opiniões emitidas em documentários.

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Marco Faustinohttp://www.e-farsas.com/author/marco
Jornalista e colaborador do site de verificação de fatos E-farsas entre janeiro de 2019 e dezembro de 2020. Entre junho de 2015 e abril de 2018, trabalhei como redator do blog AssombradO.com.br, além de roteirista do canal AssombradO, no YouTube, onde desmistificava todos os tipos de engodos pseudocientíficos e casos supostamente sobrenaturais.

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