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As oferendas do candomblé eram para escravos fugitivos?

Falso

As oferendas do candomblé eram para escravos fugitivos?

Será verdade que as oferendas deixadas nas encruzilhadas para os orixás no candomblé eram uma forma de dar comida aos escravos fugitivos?

O texto surgiu nas redes sociais no final da primeira quinzena de junho de 2016, indo parar no nosso grupo do Facebook no dia 15 de junho. De acordo com a postagem,  um professor chamado Leandro – que seria um historiador da UnB – as oferendas deixadas nas encruzilhadas era uma forma dos negros alimentarem seus irmãos escravos que estavam fugindo dos feitores.

Segundo o tal professor, os negros escolhiam lugares estratégicos por onde escravos fugitivos passariam e colocavam comida para matar a fome desses indivíduos, além de uma boa cachaça para aliviar as dores do corpo.

Será que essa constatação é verdadeira ou falsa?

Oferendas eram uma forma de alimentar os escravos fugitivos! Será verdade? (foto: Reprodução/Facebook)

Verdade ou farsa?

A ideia de que o ritual das oferendas tenha surgido com esse fim aqui no Brasil não procede, pois sabe-se que isso vem desde as religiões africanas pré-escravatura. Os sacerdotes africanos que vieram para o Brasil como escravos, entre 1549 e 1888, tentaram de uma forma ou de outra continuar praticando suas religiões em terras brasileiras. Foram os africanos que implantaram suas religiões no Brasil, juntando várias em uma casa só para a sobrevivência das mesmas. Portanto, isso não é invenção de brasileiro.

As oferendas, segundo o candomblé:

“[…]são rituais compostos de frutas, alimentos, carnes, bebidas, flores, louças e adereços que servem para oferecer aos Orixás, como uma súplica para se alcançar uma graça, bem como para homenagear e cultuar um Orixá, de forma a fortalecer o nosso vínculo com o mesmo.”

Falta de dados

O texto amplamente compartilhado no Facebook não diz exatamente em que época esse recurso de se usar a oferenda para alimentar os escravos fugitivos teria se iniciado, o que torna difícil a comprovação dos fatos narrados. De qualquer forma, desde a primeira leva de africanos que chegou aqui no Brasil (provavelmente, em 1538), eles não tinham nenhum acesso livre para ficar indo a “encruzilhadas” além de não terem comida de sobra para distribuir para “os irmãos foragidos”.

Também não encontramos em nenhum livro ou tese de mestrado algo validando a essas afirmações a respeito da origem das oferendas no candomblé. Provavelmente, alguém resolveu criar essa historinha e espalhar pela web…

Como é explicado nesse site, a carne do animal sacrificado não é oferecida diretamente às divindades: a parte oferecida é conhecida como axé do animal: são o sangue e outras partes que não são usualmente consumidas. A carne nunca é desperdiçada!!!

Além disso, explica o site, as velas não fazem parte do ritual original, que veio de influências europeias e que os escravos não tinham fácil acesso.

O texto também coloca no mesmo calderão a umbanda e o candomblé (e chama tudo, pejorativamente, de “macumba”), mas a umbanda surgiu décadas após a abolição da escravatura.

Professor Leandro

Uma busca na página de docentes da UNB e não encontramos nenhum “Leandro”. No entanto, descobrimos que há um professor chamado Leandro Santos Bulhões de Jesus que dá aulas de história na Universidade de Brasília como professor substituto. Seu Currículo Lattes é bem rico.  

Com essa “pista” em mãos, fomos atrás de alguma publicação feita pelo professor que comprovasse ou desmentisse esse texto atribuído a um “professor Leandro da UNB. Encontramos uma nota onde o professor Leandro explica que algum aluno deve ter assistido a uma palestra sua e escreveu “o que entendeu” no Facebook um texto associando seus argumentos a uma espécie de “história das origens das oferendas e da macumba”, mas que não é bem assim.

A nota do professor se encaixa perfeitamente com o depoimento do aluno Lua Xavier, que explicou em seu perfil do Facebook que sua apresentação do trabalho de conclusão de curso acabou se tornando um enorme mal-entendido na web…

O site Xapori ajuda a desmentir essa história a respeito das oferendas, além desse texto bacana do antropólogo Marcelino Conti a respeito da série de mentiras inventadas por essa farsa da web.

Conclusão

As oferendas do candomblé não eram feitas para alimentar os escravos fugitivos!  

Gilmar Henrique Lopes é Analista de Sistemas e, em 2002, criou o E-farsas.com (o mais antigo site de fact checking do país!) que tenta desvendar os boatos que circulam pela Web. Gilmar é o autor do livro "Caçador de Mentiras" pela Editora Matrix e da aventura de ficção infantojuvenil "Marvin e a Impressora Mágica"!

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